O fotógrafo apaixonado
O fotógrafo apaixonado
Suas lentes eram dotadas da capacidade de captar os mais distintos detalhes daqueles raios brilhantes que emanavam de seu corpo. Sob a luz da lua, refratava a luz branca que descia noite adentro, desde a camada mais estratosférica dos céus, até chegar em seu corpo banhado pelo mar e expandir-se em várias direções, tal como um diamante na mira de um feixe de luz.
O fotógrafo apaixonado era incansável.
Fosse sob a luz da lua cheia ou do sol vespertino, tudo o que precisava ouvir era: “me entrego ao seu olhar” – bastava essa entrega, esse ato firme de confiança total de seu amado, para que empunhasse sua câmera, levando-a diante de seu olho direito, o preferido, e esperava o momento certo para capturar em uma fração de segundo alguma imagem que entraria para a eternidade.
Não era preciso ter pressa. Não se devia forçar o tempo, andar logo, andar depressa, sob a égide de um medo de perder o momento. Ou do amado se ansiar por uma garantia de que o momento havia sido capturado em sua beleza.
O tempo parava quando o fotógrafo apaixonado olhava por entre aquelas telinhas no centro da câmera.
O mundo, atônito, suspendia o giro. A respiração se encolhia até quase desaparecer. E então as ondas e até o canto de acasalamento dos passarinhos se silenciava.
Era como seu o próprio Divino elevasse o dedo indicador à boca e sibilasse à sua Criação, ao tempo, “Psiuuu!”.
Era preciso um silêncio interior ensurdecedor para que o fotógrafo apaixonado pudesse ouvir lá de longe, dos confins de seu coração, um quase inaudível – porém firme – “agora!”. O comando atravessava veias e mais veias, células, buracos, túneis, moléculas e tudo o que há de mais insólito no corpo dos mortais, apenas para dar aos dedos a agilidade e precisão para realizar talvez a mais valiosa missão de sua existência: guardar a imagem de seu amado, cada vez mais lindo, mais cintilante, mais amado. Eternamente.
O olhar de seu amado, ao se encontrar com sua imagem naquele papel colorido impresso que saía instantaneamente da câmera, valia mais que tudo.
“A beleza não está apenas nos olhos de quem vê”, pensou certa vez o fotógrafo apaixonado. “Está nos olhos de quem te faz se conciliar com seu próprio reflexo, seja na água do lago ou num papel.
Ricardo Lima
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