Quando o fim chega

 

Então é isso. A mensagem dele chegou. A coragem que eu nunca tive antes e que veio do outro para me ensinar uma das lições mais importantes que qualquer pessoa deve aprender: a respeitar o fim das coisas. 

Eu coloquei um fim na nossa relação, porém demorou muito tempo para que eu verbalizasse isso. Foi necessária toda uma montanha-russa de emoções, descontentamentos e traições que culminaram numa nova paixão. Efêmera, intensa, que chegou como um tsunami desde o primeiro dia que nos conhecemos. Esse tsunami saiu arrastando todas as raízes e construções capengas que não estavam firmemente assentadas no solo árido da nossa relação de tantos anos. 

Não teria sobrado pedra sobre pedra? Claro que teria. O amor, o carinho e a admiração estavam lá ainda, debaixo dos escombros. As raízes mais profundas que nutriram nossa vida a dois por tanto tempo jamais seriam, e não serão, arrancadas mesmo que todas as placas tectônicas do planeta colidissem de uma só vez.  

Tentamos e tentamos, ambos, escavar atrás dessas raízes, em busca de plantá-las em outro lugar. Talvez não desse para ser no mesmo jardim que estavam antes da destruição total. Talvez desse para plantá-las em um pequeno canteiro, ou mesmo dentro de um quartinho com janela, por onde os raios de sol entrariam, bem como as gotas de chuva, tratando de nutrir as pequenas raízes, que dariam brotos e assim poderíamos recomeçar do zero. Mas era necessário esforço demais. 

Estávamos ambos muito machucados, feridos, de tanto que tivemos que lutar para superar a devastação que havia assolado nossa relação. Já não tínhamos forças para escavar tanta mágoa, tanta confusão mental, tantas transformações que aconteceram desde então. Não valia mais a pena continuar abrindo feridas enquanto cavávamos, machucarmos nossas mãos e corações em busca de resgatar algo que já não estava mais ao nosso alcance. 

O tempo se encarregou de nos levar para direções diferentes. Tal como o vento forte que anuncia uma mudança de temperatura, que nos arremessa para longe um do outro justo no momento em que começava a ficar insuportável para um de nós essa caça às raízes. Sábio é o vento. Espalha sementes, pode derrubar árvores e até ninhos de passarinhos. Mas ele, em si, não mata. Ele muda tudo. Cabe a cada ser vivo se adaptar às novas condições, ao novo terreno.

O fim já havia chegado. Às vezes dói demais aceitar. Às vezes é mais insuportável deixar ir embora do que ficar e se machucar mais e mais, num ciclo infinito. Mas se você tiver a coragem de abrir mão da dor mais suportável, soltar desse último fio de esperança ao qual você se agarra obstinadamente, e se deixar cair no buraco escuro embaixo de você, a princípio você entrará em queda livre. Vai cair, cair e não vai saber o que vai acontecer contigo. A certeza de que vai se despedaçar quando atingir o fundo virá. Mas logo perceberá que o buraco na verdade te levará a outros cantos do mundo. Outros ambientes, habitados por outras pessoas, outros tipos de árvores, de raízes e mesmo de solos. Talvez ali, nesse terreno desconhecido, você encontre outros jardins, mais férteis, para plantar suas próprias sementes - que estão sempre contigo, em algum lugar, mesmo que você não as encontre logo de cara. E ali poderá florescer novamente. 

E talvez um dia, um lindo beija-flor traga em seu pequeno bico um pouco do pólen das flores dele, do seu antigo amor. Trazendo-o diretamente do outro canto do mundo, onde o outro plantou o jardim dele.


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